INTRODUÇÃO
Quando um investidor aplica numa startup, ele encara como um investimento de baixa previsibilidade, com grande amplitude de variação entre o lucro e o prejuízo que pode esperar dessa aplicação. É bem diferente de quando ele aplica na poupança, numa LCA ou num CDB, que ele tem alta previsibilidade de quanto pode esperar dessa aplicação. Na poupança ele sabe que pode esperar ganhar -1% a 1% ao ano acima da inflação nos próximos 20 anos, dificilmente será pior que 1% abaixo da inflação ou melhor que 1% acima da inflação. Mas no caso de uma startup, pode falir em menos de 1 ano, ou pode crescer muito rapidamente e multiplicar 10 vezes seu investimento, é quase uma loteria.
Para os investidores seriais, que aplicam em várias empresas, a grande maioria das startups resulta em perdas, enquanto as raras exceções que geram bons resultados podem cobrir as perdas, tornando o resultado global ligeiramente positivo, similar ao resultado global que ele teria se tivesse aplicado na poupança.
Mas e se houvesse uma maneira de conciliar os altos ganhos das melhores startups com a alta previsibilidade da poupança? Naturalmente esse é o melhor dos mundos. Mas será que algo assim existe?
Esse artigo trata justamente dessa questão, sob uma perspectiva estritamente baseada nos fatos, e a conclusão é surpreendente.
EM QUE ESTÁGIO DE DESENVOLVIMENTO SE ENCONTRA O MERCADO FINANCEIRO?
Existem algumas áreas do conhecimento que avançam mais rapidamente do que outras. A Matemática, por exemplo, está séculos ou até milênios à frente do que nossa tecnologia atual possibilita explorar. Os grandes arranha-céus de Dubai, os aviões e quase todas as tecnologias que utilizamos em nosso dia-a-dia foram construídos utilizando matemática do século XVII ou anterior.
Praticamente todos os artefatos humanos que se vê nessa foto utiliza matemática do século XVII ou anterior.
Se, por um lado, a Matemática se encontra muito à frente de outras áreas, por outro lado a Economia e os métodos utilizados para operar no Mercado Financeiro ainda se encontram num nível medieval. Além disso, em vez de tentarem melhorar essa situação, o que se observa é um triste conformismo, em que as pessoas simplesmente aceitam que continue dessa maneira.
A maior gestora do mundo, BlackRock, com 9,57 trilhões de dólares sob gestão, entrega apenas 0,3% ao mês de rentabilidade real para seus clientes.
Em algumas áreas do conhecimento, a humanidade chegou à Lua, dividiu o átomo e desvendou muitos mistérios sobre o Universo, enquanto em outras áreas se continua fazendo o equivalente a cultivar a terra com bois puxando arados. Existem recursos muito mais eficientes e sofisticados, mas não estão sendo devidamente explorados.
Nesse artigo trataremos de duas questões fundamentais:
1. O real significado de “risco”.
2. Em que medida o Mercado Financeiro é realmente imprevisível. Na verdade, o item 2 está ligado ao item 1, conforme veremos mais adiante.
Há artigos nos quais já discutimos o significado de “risco”, por isso aqui daremos apenas uma abordagem resumida a esse tópico. O ponto principal é que a maioria das pessoas interpreta “perda” como uma redução nominal no patrimônio líquido quantificado explicitamente. Mas essa é uma visão ingênua e grosseiramente incorreta. Para medir corretamente o risco é necessário considerar as perdas reais em poder de compra, levando em conta os custos de oportunidade e não perdendo de vista as desvalorizações implícitas e “invisíveis”.
O VERDADEIRO RISCO DO MERCADO IMOBILIÁRIO
Por exemplo: em maio de 2011, um amigo comentou que pretendia investir utilizando o Saturno V, mas depois acabou optando pela compra de um imóvel. Naquela época o Saturno V tinha menos de 1 ano de atividade em contas reais, por isso ele achou que seria mais seguro investir em algo que na opinião dele seria mais “sólido”. Em 2015, o imóvel havia se “valorizado” nominalmente cerca de 27%, enquanto a inflação (INPC) havia subido 32% no mesmo período. Portanto houve uma pequena desvalorização real. Além disso, nesse mesmo período o Saturno V gerou quase 900% de lucro. Isso significa que essa pessoa perdeu 3% por desvalorização em relação à inflação e quase 90% em custo de oportunidade, porque se tivesse aplicado R$ 1.400.000,00 em maio de 2011 utilizando o Saturno V, teria mais de R$ 13.000.000,00 em 2015, entretanto, o imóvel que ela preferiu comprar, por julgar que seria mais “seguro”, estava valendo R$ 1.780.000,00, cujo poder de compra correspondia a cerca de 1.350.000,00.
Ou seja, em 2015 ela estava com apenas 10% do que poderia ter se tivesse tomado a decisão correta, resultando numa perda real em custo de oportunidade de 90%.
Há várias maneiras incorretas de se medir o tamanho desse prejuízo, e geralmente depois que tomam a decisão errada, as pessoas tentam se convencer de que não foi tão errada, um pensamento que alivia a dor, mas não restitui o dinheiro perdido e ainda aumenta a probabilidade de que o mesmo erro continue se repetindo.
A pessoa pode tentar convencer a si mesma de que pagou R$ 1.400.000 e o imóvel passou a valer R$ 1.780.000, “portanto” foi bom negócio. Uma interpretação obviamente errada, mas conveniente para não admitir que fez mau negócio.
Se a pessoa tiver um pouco mais de conhecimento sobre Economia, pode perceber que se houve uma inflação maior do que a valorização nominal no mesmo período, então houve uma redução de R$ 1.400.000 para R$ 1.350.000. Se a pessoa tiver uma visão mais sofisticada e empreendedora, ela compreende que teve a oportunidade de fazer uma aplicação que teria transformado seus R$ 1.400.000,00 em mais de R$ 13.000.000,00, portanto houve um prejuízo gigantesco entre o que ela tem e o que ela poderia ter se tivesse escolhido a oportunidade correta. Esse é o chamado “custo de oportunidade”, e que poucas pessoas enxergam como perdas. Em alguns casos, elas se esforçam para não enxergar, porque a diferença entre o que elas poderiam ter ganho e o que elas de fato ganharam (se ganharam) é tão dolorosa que preferem fingir que aquilo não aconteceu, e com isso acabam perpetuando o mesmo erro.
COMO OS MULTIBILIONÁRIOS LIDAM COM O RISCO
As pessoas geralmente pensam que negócios extraordinários, como os que transformaram Musk ou Bezos em multibilionários, são pouco acessíveis. De fato, geralmente os melhores negócios são raros e não são muito acessíveis, mas muitas vezes eles estão diante do nariz, entretanto a pessoa prefere não os enxergar, ou prefere deixar para depois, ou simplesmente prefere aplicar no CBD que paga uma pequena fração desses ganhos, abraçando a ilusão disseminada pelos bancos de que esse é o caminho seguro. Como resultado natural, ela colherá os frutos de suas decisões, e com escolhas medíocres e triviais, terá resultados medíocres. Como diz o velho provérbio: ”as pessoas são livres para suas escolhas, mas são escravas das consequências”.
O que distingue investidores como Musk da maioria dos outros é que eles levam muitíssimo a sério as perdas em custo de oportunidade. Se daqui a 5 anos eles puderem ter 10 vezes o que tinham, mas tiverem apenas 2 vezes, encaram isso como uma perda e tentam corrigir suas decisões, enquanto a maioria das pessoas encararia isso como um ganho e se conformaria com esses resultados, sem se preocupar em multiplicar seus ganhos o máximo possível.
Portanto, o principal erro que as pessoas cometem ao avaliar os riscos é não considerar o custo de oportunidade. Elas não enxergam que aquilo que elas poderiam ter ganho, mas não ganharam, representa um prejuízo. Por isso fazem escolhas que resultam em perdas gigantescas, mas que produzem a ilusão de “segurança”.
Outro erro grave cometido com muita frequência é que as pessoas associam ganhos maiores com riscos maiores, quando muitas vezes é o contrário. As pessoas geralmente interpretam aplicação na poupança como sendo algo seguro porque é improvável reduzir o valor nominal aplicado. Entretanto, é altíssimo o risco de reduzir o valor real aplicado, e num horizonte de tempo de 10 anos, 20 anos ou mais, a pessoa pode ter menor poder de compra do que no momento que iniciou sua aplicação.
Conforme já foi analisado em outros artigos, os ganhos maiores só estão associados com riscos maiores quando se utiliza a mesma estratégia nos dois casos. Por exemplo: aplicar em ações da Petrobrás (PETR4) ou aplicar com alavancagem 2:1 na PETR4 terá uma proporção de 2:1 nos ganhos e nas perdas, porque o investimento é o mesmo, mudando apenas a exposição ao risco e a rentabilidade. Porém seria possível aumentar os ganhos sem aumentar os riscos, ou aumentar os riscos sem aumentar os ganhos. Por exemplo: aplicar em opções da PETR4 aumenta o risco numa proporção maior do que aumenta os ganhos, é uma relação assimétrica. Em contrapartida, fazer uma trava com opções, dependendo da trava, do volume aplicado, do cenário e de alguns outros fatores, pode resultar num aumento de performance sem aumentar o risco. E existem muitas outras maneiras mais sofisticadas de aumentar a rentabilidade sem aumentar o risco e até mesmo reduzindo o risco.
Por isso quando se dispõe de uma opção de investimento que gera 20% ao ano e se prefere aplicar numa alternativa que gera 7% ao ano, simplesmente porque a volatilidade é menor, se está perdendo sistematicamente essa diferença a cada ano, em custo de oportunidade, e a avaliação correta do risco não deveria ser realizada da maneira simplória como costuma ser feita.
GANHOS PASSADOS NÃO SÃO GARANTIA DE GANHOS FUTUROS?
Com isso chegamos ao segundo item: previsibilidade do Mercado. A “segurança” da poupança não está apenas em sua baixa volatilidade, mas principalmente em sua estabilidade de longo prazo e em sua previsibilidade. Quando a pessoa aplica num fundo que está gerando 50% ao ano nos últimos 2 anos, quais são as chances de que esse fundo continue gerando 50% ao ano nos próximos 10 anos? Ou sequer fique positivo nos próximos 10 anos? A poupança pode ficar abaixo do CDI e algumas vezes abaixo da inflação, mas é muito improvável que num horizonte de tempo de 10 anos ela fique negativa, enquanto o fundo que rendeu 50% ao ano nos últimos 2 anos, se não houver boas justificativas para supor que manterá essa performance no futuro, é bastante provável que fique negativo nos próximos 10 anos.
Por isso a previsibilidade é um dos parâmetros mais importantes, pois permite controlar o risco dentro de limites seguros e maximizar os ganhos dentro desses limites, combinando alta performance com excelente segurança.
Existe um mantra amplamente repetido no Mercado: “resultados passados não são garantia de resultados futuros”. Isso é “verdade”, mas não é toda a verdade. Não há garantias de que a vida na Terra não seja aniquilada amanhã por uma guerra nuclear ou pela colisão com um grande meteorito ou mesmo por uma pandemia. Também não há garantias de que a poupança não seja confiscada ou ocorra alguma outra maluquice da pessoa que estiver controlando o país. Mas esses riscos são baixos e os eventos envolvendo grandes perdas na poupança são raros, enquanto os eventos envolvendo grandes perdas na maioria dos fundos de renda variável são altos.
Por isso quando se analisa o risco de oportunidade é necessário separar os investimentos mais previsíveis dos mais imprevisíveis. Todos os eventos apresentam algum nível de imprevisibilidade, inclusive a poupança, pelos motivos citados acima. Num histórico de poucas décadas, a poupança já foi confiscada uma vez. Os títulos emitidos pelo governo também já tiveram histórico de calotes várias vezes em menos de 70 anos, portanto o tesouro direto é muito mais arriscado do que se costuma imaginar.
O nível de risco está muito mais estreitamente relacionado à previsibilidade do que à volatilidade negativa, embora a volatilidade também seja um parâmetro que precisa ser considerado com muita atenção.
Prever que amanhã vai chover é mais incerto do que prever que o mercado da esquina estará aberto. Prever que o Sol “nascerá” amanhã (nos países com latitude abaixo de 66º) é mais certo do que prever que o mercado da esquina estará aberto. Prever que o valor de 𝜋 continuará sendo o mesmo amanhã é mais garantido do que prever que o Sol nascerá e assim por diante.
Há diferentes níveis de previsibilidade, e no caso do Mercado Financeiro não importam as previsões de eventos individuais, mas as probabilidades de grandes amostras de eventos a longo prazo. Por isso acertar as próximas três ou quatro operações, ou ter acertado as seis últimas operações, tem pouca importância, assim como estar positivo no último mês ou no último ano. Mas estar positivo nos últimos 10 anos ou 20 anos é um fato mais expressivo, que pode indicar estabilidade de longo prazo, não apenas porque cobre um período muito mais longo, mas também porque esse período mais longo inclui maior variedade de cenários de altas e baixas, entre outros motivos.
Quando digo “pode indicar”, em vez de dizer categoricamente “indica”, é porque depende de como as performances se distribuem. Esse tema é analisado com mais detalhes em outros artigos. https://www.saturnov.org/artigos
Geralmente comparo as previsões no Mercado com os lançamentos de dados, porque em ambos os casos não há como saber se o próximo lançamento resultará em ganho ou perda. Embora não seja possível prever com segurança os eventos individuais, em ambos os casos é possível prever com excelente precisão os resultados a longo prazo.
Se um dado não-viciado, com 6 faces numeradas de 1 a 6, for lançado apenas uma vez, embora a probabilidade de que o resultado seja menor ou igual 4 seja maior do que a probabilidade de o resultado ser maior do que 4, o risco de essa previsão falhar é grande. Porém se o mesmo dado for lançado 1000 vezes, a probabilidade de que nesses 1000 lançamentos haja predominância de números menores do que 4 é muito maior do que a probabilidade de haver predominância de números maiores do que 4.
Isso se deve ao efeito cumulativo, porque cada evento individual tem uma pequena vantagem em probabilidade, de modo que uma longa série de muitos eventos acumula uma grande vantagem em probabilidade. Por isso é que uma estratégia eficiente se impõe e fica positiva a longo prazo, mesmo que ocorram algumas perdas a curto prazo. Analogamente, uma estratégia ineficaz ficará negativa a longo prazo, mesmo que tiver sido beneficiada pela sorte a curto prazo.
As escolhas sobre investimentos precisam se apoiar essencialmente nisso: identificar investimentos com maior probabilidade de gerar lucros do que perdas a longo prazo, cujo histórico indique alta previsibilidade no comportamento. Em seguida, escolher entre os investimentos que atendem a esse quesito, qual oferece maior assimetria positiva. Essa é a maneira correta de lidar com o custo de oportunidade. Escolhendo a alternativa mais lucrativa e com resultados suficientemente previsíveis.
Desde os anos 1980 existem recursos tecnológicos e matemáticos suficientes para se fazer previsões bastante seguras sobre o comportamento do Mercado Financeiro a longo prazo. Esse é o detalhe que separa a Ciência nos investimentos da especulação imobiliária. Se o investidor escolhe um produto de investimento rigorosamente testado e validado, como o Saturno V, ele pode terá a previsibilidade como aliada, o que não é possível em nenhum outro investimento, não apenas no setor imobiliário. O fato é que se não existem dados históricos suficientemente completos e detalhados para serem examinados, não há como desenvolver modelos matemáticos para identificar arquétipos de padrões se repetem nessas séries histórica, e sem identificar corretamente esses arquétipos, não há como fazer prognósticos confiáveis.
O volume de dados necessários para isso é gigantesco. Os históricos de cotações de final de dia, por exemplo, não são suficientes. Os históricos de hora em hora também não. É necessário dispor de históricos minuto a minuto e, preferencialmente, tick a tick. Além disso, precisam ser históricos que cubram períodos suficientemente longos para atravessar diferentes cenários econômicos e políticos.
Por isso é inevitável que até os melhores investimentos eventualmente apresentem alguns períodos negativos, mas desde que a probabilidade de ganho multiplicada pelo tamanho médio de cada ganho seja maior que a probabilidade de perda multiplicada pelo tamanho médio de cada perda, a Matemática se impõe e os resultados positivos prevalecem a longo prazo. O fundo Medallion, de James Simons, é o melhor exemplo disso.
As bases de dados necessárias para essas pesquisas podem ultrapassar 1.000.000.000 de linhas, isto é 1.000 vezes mais que o limite de linhas do Excel (1.048.576). Cada linha representa um tick e cada tick precisa ser examinado com base em uma lista de critérios, para decidir se compra, vende, aguarda, modifica etc. As bases de dados sobre o Mercado Imobiliário geralmente contam apenas com variações diárias em históricos de pouco mais de 15 anos, portanto menos de 5.000 linhas de dados, muito aquém do mínimo necessário. Nos casos de franquias e outros empreendimentos a situação é ainda pior, com menos dados e com graves distorções, conforme já analisei no artigo no qual comento sobre franquias.
O Mercado Financeiro é uma das raras alternativas de investimentos na qual é possível aplicar com um nível muito alto de segurança e previsibilidade. Embora seja possível, não é nada fácil, por isso é que pouquíssimos fundos conseguem explorar corretamente os recursos disponíveis.
Embora muitos desses recursos estejam acessíveis a todos, nem todos sabem como tirar proveito disso, assim como nem todos os futebolistas jogam como Pelé e nem todos os compositores alcançam o nível de excelência de Bach. Muitos tentam fazer isso, mas são pouquíssimos os que conseguem. A dificuldade principal é que não existe uma literatura pronta, que basta ler, copiar e aplicar. O “problema” é que 100% dos livros e cursos sobre o Mercado Financeiro não ensinam algo que possa ser aplicado para gerar lucros de forma consistente.
Para ganhos pequenos (1,46% ao ano), Buy & Hold é suficiente, e não precisa de um livro para aprender isso. Mas para quem almeja ganhos maiores, nenhum livro é suficiente. É necessário investigar diretamente as propriedades do Mercado e descobrir como o Mercado funciona, identificando quais dessas propriedades realmente contribuem para aumentar as probabilidades de acertar as previsões, para então formular uma estratégia baseada nisso. Assim foi construído o Saturno V, que é completamente diferente de outros robôs de investimentos, nos quais os desenvolvedores se limitam a implementar algo pronto, que leram em livros ou viram em algum curso. A maioria nem sequer chega a testar se a estratégia que pretendem aplicar funciona de fato. Outros testam de maneira inadequada, tentando forçar nos backtests os resultados que gostariam de obter, em vez de reproduzir as mesmas condições do Mercado real para investigar se a estratégia realmente funciona.
Quando um backtest repete as mesmas condições do mercado real, os resultados que ele produz são muito fidedignos e extremamente úteis para selecionar quais estratégias e quais configurações funcionam de fato, antes de usá-las nas contas reais. Se algum detalhe não está bem, pode ser aprimorado sucessivas vezes até atingir o nível necessário para ser aprovado para uso. Esse processo pode levar anos, décadas e maioria das vezes as pessoas nunca chegam a encontrar uma estratégia realmente eficiente.
Enquanto não se tem um modelo matemático adequado para descrever o comportamento do Mercado, fica-se à mercê da aleatoriedade. Mas a partir do momento que se descobre uma ou mais propriedades do Mercado que possibilitam identificar prenúncios de assimetria nas probabilidades de os preços subirem ou caírem, essas propriedades podem ser reunidas para formular critérios de entrada e saída e produzir uma predominância de ganhos sobre as perdas, com a tão almejada consistência de longo prazo. Quando se alcança esse nível, resolve-se o grande problema da previsibilidade. É o que separa a Ciência da superstição, e o Saturno V é um dos raríssimos produtos de investimento no mundo que alcançou o nível que permite ser classificado como científico.
Existem gestores muito talentosos, como Buffett, Soros, Kovner, Dennis etc., que mesmo sem operar de maneira científica, conseguem usar a intuição e fazer análises subjetivas de modo a obter mais ganhos do que perdas, mas conforme já foi analisado no artigo de nossa homenagem a Buffett, essa habilidade decai com a idade, enquanto a aplicação sistemática de uma estratégia automática validada cientificamente é imune a esse efeito.
Desde que a poupança foi criada, em 1966, ela esteve várias vezes abaixo da inflação. Na média de longo prazo, esteve só um pouco acima da inflação, com lucro real menor que 1% ao ano. Depois das mudanças de 2012, a frequência com que a poupança esteve abaixo da inflação aumentou, ultrapassando 50% do tempo. Além disso, ela já foi confiscada uma vez.
Em contrapartida, se considerar os resultados em backtests desde 1885, o Saturno V esteve mais de 95% do tempo acima da inflação. Em 2015, houve a quebra da corretora SpediaFx, na qual alguns clientes do Saturno V possuíam conta, e isso pode ser comparado ao confisco da poupança, porque esses clientes ficaram com o dinheiro paralisado durante quase dois anos e meio, até receberem a devolução integral, porém sem correção. Portanto existem alguns riscos extrínsecos ao Saturno V (nesse caso, da corretora) que não podem ser negligenciados. Por isso, desde ocorreu esse episódio com a SpediaFx, começamos a selecionar exclusivamente corretoras cujos bancos custodiantes tenham rating de crédito acima de A+ (S&P) ou A1 (Moody’s). Isso não elimina completamente os riscos, mas reduz a um patamar “aceitável”, já que esse nível é mais alto do que o dos melhores bancos do Brasil, que possuem rating B.
CIÊNCIA, SISTEMAS DINÂMICOS E PREVISIBILIDADE
Para entender um pouco melhor a questão da previsibilidade e a relação entre Ciência e previsibilidade, vamos analisar um caso histórico que se tornou famoso: o caso do cometa de Halley.
Antes de 1682, quando um cometa se tornava visível no céu, era considerado um evento imprevisível. Esses astros surgiram e desapareciam esporadicamente, a intervalos irregulares, por isso acreditava-se que não havia como prever quando o próximo cometa apareceria. Os movimentos dos planetas eram bem conhecidos e razoavelmente bem previstos pelos gregos desde o século IV a.C. O modelo de Eudoxo permitia calcular as posições dos planetas com precisão muito boa, fazendo previsões que permaneciam válidas durante décadas ou mesmo séculos. Os eclipses da Lua e do Sol também podiam ser previstos com o uso dos ciclos de Saros, com praticamente 100% de acertos, e essas previsões permaneciam válidas por milênios, mas não se dispunha de nenhum modelo capaz de predizer as passagens de cometas, e assim permaneceu por mais de 2000 anos. Aristóteles chegou inclusive a considerar que tais aparições eram impossíveis de prever por serem (na visão dele) fenômenos atmosféricos, não astronômicos.
A crença na imprevisibilidade sobre as aparições e os movimentos dos cometas persistiu por muito tempo, até que Isaac Newton formulou sua Teoria da Gravitação Universal e seu amigo Edmond Halley aplicou a teoria da gravitação para tentar explicar os movimentos dos cometas. Para começar, Newton mostrou que os movimentos dos cometas indicavam que eles se comportavam, a curto prazo (poucos meses), como objetos astronômicos, não como fenômenos atmosféricos, tal como acreditava Aristóteles. Assim, embora ainda não fosse possível medir a distância desses astros pelo método da paralaxe, tornou-se possível testar a hipótese de que a Teoria da Gravitação poderia ser eficaz na predição de longo prazo sobre os movimentos dos cometas.
Se a Teoria da Gravitação fosse uma boa representação da realidade, seria possível utilizar os dados observacionais de poucos meses para predizer os movimentos dos cometas durante anos, décadas ou até mesmo séculos. E foi exatamente isso que Edmond Halley tentou fazer. Ele constatou que os brilhantes cometas registrados em 1682, 1607 e 1531, além de terem sido observados a intervalos quase regulares de aproximadamente 76 anos, também apresentavam vários elementos orbitais semelhantes, inclusive distância ao Sol no periélio, inclinação orbital, longitude do nodo ascendente etc. O quadro abaixo mostra os dados sobre os cometas que foram analisados por Halley:
Ficou claro que seria uma imensa coincidência se fossem 3 cometas diferentes, portanto era muitíssimo provável que ele havia descoberto um padrão verdadeiro que possibilitava, pela primeira vez na História, prever corretamente quando um cometa se tornaria visível no futuro. E mais do que isso, ele podia prever até mesmo em que lugar do céu seria visível e qual trajetória no céu ele traçaria. Havia, naturalmente, uma pequena margem de erro, mesmo porque os parâmetros orbitais observados das 3 passagens não eram exatamente idênticos, e a Teoria da Gravitação de Newton previa essas anomalias como consequência das perturbações gravitacionais provocadas pelos demais planetas sobre as órbitas dos cometas. Assim, Halley previu que esse cometa retornaria em 1758.
A grande maioria dos astrônomos da época permaneceu cética, porque durante milênios, nunca alguém havia sido capaz de prever a aparição de um cometa, eram eventos completamente inesperados, eles pensavam.
Infelizmente Halley faleceu em 1742 e não teve a oportunidade de comemorar sua descoberta, mas em 25 de dezembro de 1758, suas previsões se confirmaram. Desde então, foram determinadas as órbitas de milhares de outros cometas, cujos retornos (quando são órbitas fechadas) agora podem ser previstos com boa precisão.
As aparições de cometas não eram imprevisíveis. O problema é que não se compreendia o suficiente sobre o que eram os cometas e sobre as Leis que determinam seus movimentos. Quando Newton compreendeu e descreveu essas leis, o que antes parecia ser algo fortuito e imprevisível se tornou quase tão regular quanto qualquer outra previsão trivial, como as estações do ano ou os eclipses.
Uma situação análoga ocorreu em 1982, quando James Simons conseguiu modelar o Mercado Financeiro e fazer previsões mais acuradas do que qualquer outro antes dele ou depois dele.
Prever os movimentos do Mercado é muito mais difícil do que os movimentos dos cometas, porque embora ambos sejam sistemas dinâmicos, as órbitas dos cometas são predominantemente determinísticas, enquanto os movimentos das cotações são predominantemente aleatórios, com uma pequena parcela de determinismo.
Mas a maior diferença não está na dificuldade de modelar o Mercado. A principal diferença é que as leis que regem os movimentos dos cometas e de outros astros foram publicadas em livros que rapidamente se tornaram referência, de maneira que todos puderam aplicá-las, desfrutando as descobertas realizadas por Newton. Mas no caso dos movimentos do Mercado Financeiro, poucas pessoas chegaram a descobrir essas leis, e quem as descobre não as divulga. É necessário que cada pessoa interessada investigue por si mesma, descubra essas leis e crie suas próprias estratégias com base nelas. A descoberta dessas leis está entre os problemas mais difíceis que existem, mas quem consegue resolver esse problema, alcança um nível de domínio sobre o Mercado que supera o de qualquer investimento, pois consegue introduzir previsibilidade no que era imprevisível. Essa é a preciosa vantagem competitiva que coloca o Saturno V num patamar completamente diferenciado. O Saturno V não joga com a sorte. Ele opera com base em previsões científicas.
Houve outras pessoas que chegaram perto de descobrir modelos eficientes para operar no Mercado, como Edward Seykota, Robert Pardo, William Eckhardt e Olexandr Topchylo, mas nenhum desses modelos se mostrou suficientemente versátil e duradouro. Nesse aspecto, o Saturno V também se notabiliza com resultados consistentes por mais de 120 anos em backtests e mais de 12 anos em contas reais.
O gráfico a seguir mostra as curvas de crescimento do Saturno V segmentadas a cada 11 anos, comparadas lado a lado, para que se possa verificar a estabilidade na inclinação da curva, que determina a uniformidade no ritmo de crescimento a longo prazo:
Portanto, em se tratando do Mercado Financeiro, a importância da Ciência está na previsibilidade, o que proporciona uma vantagem incomensurável em relação a qualquer alternativa não-científica, pois elimina a dependência da sorte para instaurar a segurança e a estabilidade da Matemática. Algumas pessoas podem até não gostar de estudar Matemática, mas todos amam desfrutar os recursos científicos e tecnológicos que a Matemática nos proporciona, inclusive celulares, aviões, automóveis, medicamentos, tratamentos médicos apoiados em estudos estatísticos, e os investimentos administrados pelo Saturno V.